…falamos tanto de amar e de ser amado, de fazer o bem, de aceitação e de tantos outros conceitos que por vezes nos perdemos pelos excessos. Olhando para a vida que nesta altura do ano parece ter o foco principal nas compras, no dar e o receber, e não o partilhar, o comungar, o estar e o ser, de repente me deparo um sentimento de não-pertença. Sim, não-pertença. E pode soar estranho, mas entro num centro comercial e só vejo gente andando de um lado para o outro com montes e montes de sacos, com prateleiras já vazias e depois recebo emails com imagens de crianças a comerem do lixo, e adultos sem tecto para viverem e só posso sentir-me uma estranha no meio deste caos.
Então o que vem a ser Natal?! Qual é o espírito Natalino que quero viver e transmitir as nossas filhas?! Não tem a ver com ser católica ou evangélica ou isto ou aquilo, tem a ver com algo simples que é a consciência da vida, de quem somos e do legado moral e físico que queremos deixar aqui nesta Terra.
Há anos que na nossa família fomos mudando os conceitos do dar e receber, isto porque é bom dar, é bom deixar o outro feliz e da mesma maneira que é bom receber e sentir-se importante por terem lembrado de nós, mas e depois?! Então começamos a focar no convívio, no estar com quem amamos, no aceitar o que recebemos, mas não dar como dado adquirido porque aquele presente teve muita gente envolvida nele, não só quem comprou que teve horas a trabalhar para ter o dinheiro, mas também quem o produziu, a matéria prima e enfim o ciclo todo por detrás de um pacote. E, nesta consciência, começamos por perceber que não é preciso ganhar muito e nem dar muito, é preciso dar o que é necessário, o que será útil, para que tudo tenha um significado maior e ainda que quem receba a prenda nem sempre entenda.
Mas voltando aqui ao tema principal que é a experiência do amor por meio da gratidão e não tem haver com dizer mecanicamente obrigada, mas com o sentir-se impelido a agradecer de forma genuína, pode até ser um balançar da cabeça, um sorriso de lado, porque a gratidão é tão avassaladora que nem palavras conseguem conte-la… interessante, não é?!
Então, de uns tempos para cá começamos um ciclo de gratidão pelo que temos e pelo que não temos, pelas pessoas presentes e pelas pessoas ausentes, pelo que somos e pelo que queremos ser, o processo de gratidão começou a tomar uma proporção que hoje sou grata por praticamente tudo, especialmente por aqueles momentos e pessoas difíceis que encontro, porque elas conseguem fazer algo incrível como trazer ao de cima a sombra da raiva, da vontade de gritar e de bancar a dona da verdade. Concordam comigo que estas coisas nada lindas só vêm ao de cima nos momentos de raiva e de crise, então é preciso ser grato a quem nos fez encarar a nós próprios de forma tão clara e óbvia. A tal da gratidão é tão generosa que consegue ir a todo lado e tocar a toda gente!
Quando me deparo com alguém que diz que quer morrer, que não tem nada para fazer aqui, que nem sabe porque está aqui, tenho duas formas de ver isto. Uma como Naturopata que olha a maneira como a pessoa falou, como se colocou, as nuances expressivas por que cada uma delas vai me dizer sobre um órgão ou um remédio homeopático especifico. E a outra forma é mais “espiritual”. Precisamos entender que para cada pessoa que nasce, tem pelo menos 10 almas querendo também vir para o planeta e só nasce a melhor preparada, aquela que tem todas e as melhores condições de realizar o plano divino dela. E entenda plano divino como ser gente, como fazer o que é devido respeitando a ordem natural da vida e as capacidades de cada um, não tem haver com missão de vida com coisas que só complicam o Ser e o estar.
Portanto, tivémos o privilégio de nascermos no lugar certo, na hora certa e com as pessoas certas, e não adianta reclamar de nada e ninguém, porque escolhemos o pacote todo. Então o jeito é vivermos o melhor que podemos com o que temos e somos. Não adianta querer ser quem não se é, fazer o que não se consegue, aceitar com humildade quem somos e sermos gratos por isto é um grande trabalho, é de fato um excelente trabalho, mas porque tão poucos conseguem viver isto?!?
Andamos num corre-corre de atender expectativas alheias, que nem paramos para nos olharmos, para ver e saber quem somos. Por isto, muitos começam com estes pensamentos do querer morrer, do querer fugir, porque simplesmente não olhou com olhos de ver para si mesmo, e para tudo o que isto acarreta. Nem bom e nem mau, só o que somos. E veja bem, não estamos falando de limitarmo-nos, estamos falando de que podemos ir além desde que tenhamos capacidade para tal. Não adianta pedir para uma pessoa com 1,90 cm de altura que passe por batentes de 1,60 sem ter que se abaixar, é impossível simplesmente porque o mundo é de um jeito e nós somos de outro, e tudo bem é preciso saber adaptar-se e saber também qual é o limite onde podemos ir sem nos perdemos, sem deixarmos de ser quem somos e, mais ainda, de sermos gratos por quem somos e como somos.
A gratidão passa pelo auto-conhecimento, pela auto-estima, pelo perdão e aceitação. E o que é o Natal senão o nascer do ser que mais trabalhou o amor, a gratidão e o perdão?!?! Jesus precisou ir no fundo dele mesmo para perceber qual o limite da fé, do amor e do corpo e ainda assim foi grato pela oportunidade de fazer o bem, de fazer o “correcto”, de viver o que podia com o que tinha e nem mais.
Gratidão é a forma mais simples de amarmos e vivermos em paz. Tudo começa por um obrigada que vai mudando a nossa forma de olhar para a vida e os seus acontecimentos, para as pessoas e as suas escolhas, é como se de repente as peças do puzzle começassem a fazer algum sentido. E, sendo um processo, é aos poucos que se revela e no meio do caminho também mostra o que devemos acolher e o que devemos deixar ir, mostra quem somos e os nossos limites, mas também mostra quem são os demais e os seus limites, porque tudo na vida tem começo, meio e fim.
Hoje sou grata por estar viva quando muitos já se foram, sou grata pela família onde fui criada e a que andamos a criar – e com isto entendo cada vez mais os meus pais. Sou grata pelas pessoas que encontro, que me fazem ir além de mim mesma e as que me fazem ficar dentro de mim mesma, porque não me cabe fazer o caminho de ninguém. E sou grata porque há chuva e frio, para que a terra possa descansar um pouco de um ano que foi repleto de incêndios. Sou grata porque no meio de tanta tristeza, viu-se que uma nação é o seu povo e aqui todos fizeram algo para ajudar as vitimas dos incêndios e ainda estão a fazer… a gratidão é, de facto, a palavra chave para encontrarmos paz e cor na vida.
Que venha um Natal de gratidão por se poder conviver com a família e amigos, e que isto alimente a nossa alma e coração!
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