Em cima do armário do corredor havia algumas peças, que no dizer da minha avó, não tinham utilidade.
Um porco de lata vermelha, pequeno e uma ranhura no lombo. Ao lado um galo de Barcelos, colorido e petulante, o franganote.
O porco ficava contente quando uma moeda caía na sua já gorda barriga. Era um mealheiro. Nem todos os dias havia moedas. O galo irritava-se com esse tilintar. Afinal não se entendiam.
O porco vermelho e focinho arrebitado e uns olhitos sem pestanas olhava sempre para a porta da entrada. Olhava a ver se quem entrava lhe trazia a esperada moedita.
Por sua vez o galo tinha bico pintado de amarelo, corações nas asas e penas coloridas na barriga.
O porco gozava com ele. Já se viu alguma vez um galo ter corações pintados nas asas? O bico pintado de amarelo, os olhos pintados de preto e as marmilas pintadas de vermelho, penduradas do pescoço. Que ridículo!
E era ridículo o galo.
Discutiam quando o porco arrecadava a moeda e discutiam, também, quando o galito se empertigava a fazer-se grande. Mas não passava de um galito de barro pintado.
Um dia um dos netos passou e disse:
– Quando o porco estiver cheio compro umas sapatilhas e o galo já está velho e desbotado vai para o lixo.
Eles que passavam o dia à zaragata, porque um era gordo e o outro de barro pintado, olharam um para o outro aflitos.
– Que sorte a nossa!
– A tua, disse o galo. Eu vou dar uma volta até ao lixo. Estou velho e desbotado. Enquanto tu guardas as moedas.
– O porco também lhe disse:
– Afinal nunca nos entendemos mas fomos felizes aqui.
O porco e o galito ainda lá estão.
O porco ainda não está cheio e o galito ainda tem um pouco de cor.
Os netos vão muito menos a casa da avó e as moedas também cada vez vão caindo menos.
Mas o porco e o galo continuam a discutir. Continuam a não se entender. O porco continua gordo e o galo continua de barro e com as cores cada vez mais desbotadas.
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