A ti Pai!

A ti Pai!

Tinha decidido descartar agendas e libertar-se da tirana correria do tempo.

O dia seria para os dois, só para os dois!

O fresco do inverno que lhe açoitava o rosto, transmitia-lhe uma paz há muito desejada.

Sentia-se feliz e pensava porque não fazia isto mais vezes.

Ainda distante, avistou o banco. O mesmo banco que fora em tempos, testemunha da miúda que um dia por ali aprendeu a equilibrar-se na bicicleta verde. Muitas quedas depois.

E ele lá estava. A cabeça agora coberta de cabelo cor dos anos, movimentava-se sem descanso, ora para a direita, ora para esquerda. O relógio marcava a hora combinada e sabia que tentava avistá-la.

Fora ele que sempre lhe dera mão e a ajudara a levantar-se do chão. Fora ele que lhe lavara os joelhos feridos, fora ele, feito paciência, que lhe ensinara a não desistir, a acreditar!

Finalmente os olhos deles cruzaram-se e ela apressou o passo.

– Já lhe disse que tem o sorriso mais lindo do mundo?

– Não digas isso, é só o sorriso de um velho.

Sentou-se, chegou-se a ele e encostou-lhe a cabeça no ombro.

Mergulharam num silêncio só deles e assim ficaram lado a lado, de frente para o espelho das memórias.

Ela queria falar, mas a voz estava húmida de lágrimas, de emoção. Lágrimas há muito desejadas, lágrimas reprimidas, aprisionadas, que gritavam liberdade.

As palavras saíram-lhe embargadas, quase caladas, quase murmúrio.

Obri…gada Pai!

Ângela Rego (Foto)
Paula Castanheira (Texto)

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