Um dia perguntaram-me: “A tua liderança é inata ou fizeste por isso?”
Nessa altura, dois universos se abriram na minha cabeça:
- Universo número 1: alguém achava que eu era líder e eu própria ainda não tinha essa consciência.
- Universo número dois: “Fizeste por isso? Como assim? É possível “treinar” para ser líder?
Confesso que a minha vida profissional foi bastante atípica desde o início e que, na realidade, sempre me foram aparecendo pequenos degraus que eu fui a custo subindo e que, vendo agora de fora e com desapego, estavam a levar-me para um caminho de liderança.
Recordo-me ainda que em miúda, na escola primária, eu era caladinha e circunspecta. Só me viam irar quando alguém fazia mal aos meus amigos. Nessa altura, “sai de baixo que vem bomba”: a menina caladinha tornava-se bastante abrutalhada e defendia os injustiçados com armas e bagagens. Essa característica fazia com que afrontasse os rapazes, o que mais tarde levou ao seu respeito e admiração e a ser convidada para integrar o jogo de futebol nos recreios da manhã.
Penso que se começou, nessa altura, a moldar aquilo fui durante muito tempo: frontal e sem “papas na língua”. Com o tempo, aprendi que frontalidade não é o mesmo que agressividade e que as “papas na língua” precisam, na maioria das vezes, de ser moderadas.
A liderança até pode ser algo que é inato em ti. Difícil, sim, é a boa arte de exercer liderança. E essa, é como uma tela que está sempre inacabada. Essa, sim, pode e deve treinar-se.
Perguntas-me “como?”, e eu respondo-te “Olhando ao espelho o/a líder que és”.
O que torna diferentes as pessoas que acreditam em si mesmas, no seu potencial e nas suas capacidades (mesmo quando não as têm)? Estas pessoas crescem e, sendo bons lideres, fazem crescer os outros.
A tua equipa pode ser a melhor do mundo e, ainda assim, falhar redondamente porque tu a estás a liderar. Já pensaste bem na responsabilidade que isso acarreta?
Vem comigo até ao submundo dos 3 melhores exemplos de liderança que já recebi, começando pelo primeiro conselho que me deram e que tem sempre norteado a minha vida: “Eu posso não saber fazer uma coisa, mas certamente conheço alguém que sabe”. O que é que esta simples filosofia de trabalho significou para mim?
Aos 21 anos de idade dei início a uma carreira de 15 anos numa multinacional americana. Nos primeiros meses, eu fazia absolutamente de tudo: atender telefones, triar cv’s, fazer relatórios, traduzir e retroverter, enviar faxes (sim, ainda sou do tempo do facsimile), escrever cartas, memorandos, fazer trabalhos de estafeta. Eu não sabia nada, e ao mesmo tempo sabia tudo. Quando não sabia, telefonava a todas as pessoas que eu conhecia (e até a alguns desconhecidos) para perguntar de tudo: onde, quando, quem, como se chega lá, quanto custa, em que prazo, com que meios… Eu aprendi mais naqueles primeiros 2 anos do que nos 21 que demorei a lá chegar.
O segundo bom exemplo de liderança que recebi foi: “Não me traga problemas, traga-me soluções”. Percebi cedo que se chegasse à minha chefia todos os dias com problemas, saía de lá com outros tantos. Passei a comunicar problemas e a levar soluções. Mais tarde, deixei inclusive de lhes chamar “problemas” e substitui a palavra por “desafios”. Na verdade, quando olhamos para um problema como se ele fosse um “desafio” a ultrapassar, as dificuldades tornam-se mais ténues.
O terceiro exemplo entrou na minha vida muito mais tarde. Com a minha carreira já consolidada e em “velocidade cruzeiro”, disseram-se a seguinte frase, que nunca mais esqueci: “Eu não a contratei para ser yes-man (neste caso yes-woman) mas para me contrariar se achar que eu estou errado”. Saber que eu tinha uma voz, que poderia contrapor e expressar as minhas opiniões e perspectivas foi um dos melhores ensinamentos de liderança que tive até hoje e que preconizo com as pessoas que lidero. Sei que nada sei, todos os dias aprendo e sei que a minha opinião pode estar errada. É fantástica a sensação de parar, reflectir sobre a minha opinião e a opinião de quem me está a mostrar um ponto de vista diferente e seguirmos com essa ideia nova em frente.
Não há uma fórmula mágica para liderar, todos os dias se aprende a melhorar as capacidades e características de líder. Mesmo que a tua liderança seja inata, mesmo que desde tenra idade todos te seguissem e gerasses admiração e respeito, tens sempre algo a aprender e a aperfeiçoar.
Com tempo, modéstia e respeito pelos outros, é uma aptidão que se desenvolve. Se escolhes ser um bom líder, esforça-te e treina. Com o tempo, ganhas músculo e robustez e passas aos outros exemplos como aqueles que eu recebi e que mudaram a minha vida profissional para sempre.
Carla Soares
Career Coach
www.coachcarlasoares.com
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