Aquele Dezembro ia ameno. Não fosse o calendário e podia pensar-se que se tratava de um Outono tardio. Ultimavam-se os preparativos para mais um Natal em família, a azáfama própria de uma época tão especial, tão cheia de ternura, de partilha, de abraços.
A vida corria assim, sem sobressaltos. As rotinas da vida em família sucediam-se, as arrumações, as limpezas, em simultâneo com os preparativos para um jantar de Domingo, daqueles que se querem especiais, como que para dar as boas vindas a mais uma semana.
De repente, do meio dos papéis que se arrumavam, surgiu uma verdade aterradora. Tinha acabado de descobrir a traição perpetuada pelo meu companheiro de 30 anos, o meu amigo, o meu confidente, o meu namorado, marido, pai do meu filho, aquele com quem eu partilhava os meus segredos mais íntimos, o meu cúmplice, vivia uma vida dupla!
Descobrir a mentira doeu, mas acima de tudo o que mais me custou foi perceber que os meus sentimentos tão sinceros e tão puros tinham sido desrespeitados. Senti o meu peito a doer, como se uma bomba nele tivesse explodido!
Sabem, dizia muitas vezes que se voltasse a casar seria com aquele homem de novo. Incrível, não é?
Sou de uma família de casamentos firmes, onde não havia divórcios. Percebi naquele momento que tinha vivido num mundo só meu, cor-de-rosa, onde havia confiança e verdade, senti-me ridiculamente inocente e pateta.
Todos os meus sentimentos mais nobres ficaram virados do avesso e – não tenho vergonha de o dizer – os dias seguintes vivi-os com o coração carregado de revolta, de negação, de ódio, de raiva. Procurava, sem me cansar, respostas, razões para que tudo aquilo me estivesse a acontecer, a mim – e logo a mim! Caramba, não tinha um casamento perfeito. Recordo que costumava reclamar por mais atenção, mais carinho, mais reconhecimento, mas nada que me fizesse por um segundo sequer pensar que, um dia, tudo isto pudesse desabar sobre a minha cabeça.
Bem, depois…. Depois começou um período em que vivi entre o querer perdoar e terminar tudo de vez. Sim, de repente percebi que todas as decisões estariam nas minhas mãos, no meu coração despedaçado. Mas, como que recebendo um sinal, vindo sei lá de onde, naquela noite em que se festejava a entrada de mais um ano novo, tomei a decisão – queria mudar em definitivo a minha vida, a separação era o caminho!
Descobri que nem ao Centro Comercial sabia ir sozinha. Aliás, parecia mesmo que não conseguia fazer nada, sem aquele que eu pensava ser a minha alma gémea, ao meu lado!
Se foi difícil? Sim, foi aterrador. Foram dias e dias em que só sentia algum conforto a contemplar a chama da lareira, enquanto tentava desesperadamente esgotar o meu stock de lágrimas. Não tinha vontade de nada, não encontrava prazer em nada que fizesse, por onde olhava só conseguia ver escuridão.
Era inevitável. A notícia foi transmitida à família, aos amigos mais chegados. O meu filho era o único até então que sabia de tudo, tinha assistido à descoberta, não havia como esconder dele.
Numa fase seguinte, era literalmente arrancada de casa para me distrair. Mas, estas tentativas, no inicio resultaram num tremendo fracasso. Olhava à minha volta e só via gente feliz, famílias em harmonia, casais enamorados e eu? Que andava eu ali a fazer? Sentia-me um patinho feio, sem amor-próprio, sem sensualidade, a carregar nas costas todas as culpas do Universo!
Descobri que nem ao Centro Comercial sabia ir sozinha. Aliás, parecia mesmo que não conseguia fazer nada, sem aquele que eu pensava ser a minha alma gémea, ao meu lado!
Bati no fundo. Bem no fundo, acreditem!
Quando consegui finalmente falar sobre o assunto, posso dizer-vos que foi altura de perceber que não estava sozinha, que a minha família estava ali, completamente disponível para me ouvir, para me ler, para me abraçar, para me reconfortar. E os amigos, que bom tê-los!
Família e amigos foram por essa altura de crucial importância, para o início da minha Primavera!
Gritei, falei, escrevi, chorei, praguejei……mas eles estavam sempre por ali, os meus pais, o meu mano, os meus amigos e claro sempre o meu filho!
Graças a todos estes anjos, comecei aos poucos a ganhar força, a ter vontade de fazer a vida avançar.
Consegui energia para tratar do divórcio. Foi dramático no início, mas depois fui buscar força a uma caixinha mágica, e quando a racionalidade começou a ter algum protagonismo no meio da confusão em que se encontrava o meu coração, comecei de novo a ver a Vida a Cores. E, por incrível que pareça, o dia em que assinei o divórcio, foi um dos dias em que senti mais paz!
Recordo como se fosse hoje a viagem de regresso, do escritório de advogados, a marginal estava mais linda do que nunca, as janelas do carro abertas, a musica… Sim, lembro-me perfeitamente. Era Enya e eu estava leve e de novo voltei a sentir-me linda!
Aos poucos comecei a minha recuperação. Dei comigo a perceber que conseguia fazer tudo ainda melhor, por mim, para mim.
Descobri pessoas fantásticas, motivação para viajar sozinha, para ir a um restaurante sem sentir pena de mim, a trocar a cadeira vazia à minha frente pela companhia de um livro.
E que fantástica companhia eu descobri em mim!
Despertei para um mundo novo, em que me sentia forte e segura. Por esta altura encontrei o Yoga, o vegetarianismo, e assim fui-me mimando e perdoei a quem me magoou.
Quero partilhar esta experiência de vida, não para me lamentar, mas para transmitir uma mensagem de esperança. Porque o melhor está sempre à nossa espera. Não podemos desistir nunca, temos de ser pacientes connosco e aceitar.
O perdão é o caminho para a nossa libertação. Muitos mais desafios se seguiram e com certeza muitos mais se seguirão. Mas acreditem. A vida é um lugar fantástico, não a desperdicem, aproveitem-na em cada segundo para sorrir, abraçar e partilhar, somos seres maravilhosos e tudo está em nós, não nos outros!
E quando estamos em paz, quando nos amamos, temos o melhor dos que nos rodeiam!
Paula Castanheira
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