Quando nos olhamos ao espelho e vemos o reflexo de um corpo materializado em alguém que não identificamos, perguntamos quem somos mas não obtemos resposta. Um nevoeiro de dúvidas adensa-se sobre a nossa cabeça. Visualizamos à nossa frente a figura abstracta de um conjunto de membros ligados entre si, que se articulam de forma pouco elegante como uma daquelas marionetas que se encontram perdidas dentro de baús esquecidos em sótãos empoeirados. Nesses momentos de reflexão levamos algum tempo a perceber que para entendermos aquilo que vemos somos obrigados a escutar o que os nossos olhos transmitem ao nosso cérebro. Perdemos a noção da realidade quando nos esquecemos de quem somos. Perdemos um pedaço de nós quando nos deixamos manipular por acções que não fazem parte de nós, que não nos pertencem e colocam em risco a lucidez dos nossos pensamentos. Respiramos fundo e voltamos a olhar para o espelho. Agora já conseguimos ver a nossa cara que vai ficando cada vez mais nítida, vemos os nossos lábios murmurar palavras soltas: chamam por nós, gritam o nosso nome. Quando olhamos para o fundo dos nossos olhos sentimos que nos estão a sugar para o interior do nosso corpo e que nos obrigam a procurar, no meio das entranhas, aquilo que se perdeu. Ao longo dos anos vamos cultivando e transformando o nosso Ser em algo único. Criamos uma personalidade própria que muitos procuram moldar à sua imagem, roubando o que de bom existe, e deixando apenas os restos de frustrações suas que não nos dizem respeito. Aquilo que vemos quando nos olhamos ao espelho deve ser a imagem de alguém que respeita os seus princípios e nunca se perdeu de si próprio. Só assim vale a pena viver.
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