Quando o tempo passa e a vida segue rumo, já não somos mais só filhos e nem só pais… já somos “paisfilhos”. A fase que chega para todos e que nem sempre é fácil. Se por um lado ser filho dá trabalho… ser pais é ainda maior o desafio, mas e quando temos que ser pais dos nossos pais?!
Hoje, vou falar desta fase que é dolorida e ao mesmo tempo uma grande prática de amor, porque é preciso amar muito para entender que os nossos “heróis” estão fragilizados e com medo do que lhes possa acontecer ou do que nós vamos ou não fazer.
Decidir sobre a vida dos nossos filhos já é um tema exigente, pois não queremos errar já que eles têm a vida toda pela frente. E decidir sobre os nossos pais que estão com um tempo de vida mais limitado, e num limitado que não se sabe bem como será já que as marcas do tempo se fazem presente nas maleitas e doenças que se apresentam. Hoje, encontro-me neste meio do caminho. Como pais, estamos apoiando e ajudando nas escolhas das nossas adolescentes e jovens; como filha, tenho que encontrar o caminho do meio com os meus irmão sobre a nossa mãe, visto que nosso pai faleceu há muito tempo, e este caminho do meio é medido pela cabeça e possibilidade de cada um. Portanto, não pense que ter muitos irmãos ajuda nesta fase, porque cada um pensa e sente só por si, e aí, filho único tem que decidir só, mas irmãos precisam primeiro encontrar a escolha onde todos estão de acordo… outro exercício de amor e aceitação.
Porquê deste texto? Bem, porque no último mês muito se falou sobre a eutanásia, e com tanta gente jovem dando palpites fiquei a pensar nos hospitais cheio de velhinhos cujos filhos foram lá os “deixar” na noite de natal ou na passagem de ano… é tenebroso ver a solidão daqueles olhos. Sei disto porque dias antes do natal há dois anos tive horas dentro das urgências e os via só a chegar, um após o outro, e seus filhos a saírem assim de mansinho… gente eu dou mesmo os parabéns aos enfermeiros e médicos que mantém as suas composturas, porque a minha vontade diante daquele cenário era chamar o povo e dizer algumas coisas nada boas ou educadas. Mas enfim… diante disto, penso que seja muito precipitado dizer não faça isto ou faça aquilo, cada um sabe a dor de ser e de viver, cada um deveria ter direito a escolher como morrer ou viver. Sem conceitos ou pré-conceitos, o certo é que toda escolha terá um preço, a questão é saber o quanto se está disposto a pagar pela mesma.
Não sou a favor e nem contra, sou a favor dos direitos de cada um, e depois é escolha de cada um. Se vão pagar aqui ou na outra vida, se vão para no limbo ou vão para o céu, se está certo ou errado… quem sou eu para julgar?
Então, antes de dizer que sou a favor disto ou daquilo, que ao fim e ao cabo são escolhas de cada um, o que penso é que todos deveria poder escolher responsavelmente, mas será que temos maturidade para tal? Será que o mesmo sistema de saúde que deveria ajudar a viver melhor seria capaz de ajudar a morrer dignamente? Será que o filho que vê seu pai ou mãe morrer todos os dias de forma indigna sofreria menos com uma morte digna? Será que morrer é tão horrível assim? Será que vale tudo para se manter uma pessoa viva?
São tantas as perguntas que me vejo cada vez mais tendendo para as responsabilidades de escolhas conscientes para, e pela vida. Ensinar aos nossos filhos serem responsáveis por tudo o que fazem ou deixam de fazer, sermos responsáveis pelas nossas escolhas e não colocar a “culpa” em nada e ninguém que não sejamos nós mesmos, apresentar os fatos claros para que cada um saiba muito bem para onde está a ir e as diversas possibilidades das escolhas que se fazem.
Penso que por isto gosto tanto das constelações familiares como terapia. Afinal, ela consegue dar uma Big Picture do que andamos cá a fazer, sem culpa ou culpado, só por escolhas, perdão e amor.
Como filha, há momentos onde tentar “proteger/cuidar” da minha mãe esbarra na capacidade dela de entender que os seus limites ficaram maiores e isto é muito duro para ambas, pois uma tem que ceder e a outra avançar… mas qual é a pessoa que deixa-se levar sem antes não dar luta?
Nada na vida é tão branco e preto, as zonas cinzentas são mais do que muitas, talvez as únicas zonas claras sejam as que nós nos permitimos ser clara, porque já entendemos que entre o certo e o errado existem o que podemos viver “com” ou “sem”. Não nos cabe julgar, nos cabe pensar e fazer escolhas que podemos viver com. Se ama, demonstre amor, se não gosta, procure saber o motivo e tornar claro o mesmo, a fim de não vir a ser magoado ou magoar desnecessariamente. A vida passa, tudo passa… porque deixar para a última hora para resolver as questões com os seus pais ou seus filhos? Porque deixar para os filhos o ónus de fazer escolhas por nós?
Se é a falar que nos entendemos, então qual o medo de falar ou de ouvir? Se permita ser honesto consigo mesmo, se permita ser honesto com quem ama e com que de fato lhe interessa a opinião ou presença, porque isto de adivinhar o que o outro quer ou precisa ou sente é de doidos e não temos tempo para isto.
Neste mês dos pais, lembre de amar o seu pai enquanto o tem, de dar o seu melhor para acertar os ponteiros com ele, sem estar à espera de muito, que não seja o que cada um pode dar ou fazer. Neste momento da sua vida, honre quem é, de onde veio e para onde vai, pois são os exemplos que marcam e não as palavras.
Um Março de luz para todos.
Jaqueline Reyes
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